Olá, psi! Eu sou a psicóloga Luiza Aguiar e este é o podcast “Ansiedade em foco”. Semanalmente, eu e um convidado informamos como a ansiedade pode ser tratada por diferentes profissionais da saúde, de maneira individual ou colaborativa.
O foco deste episódio é o coração porque no dia 29 de agosto será comemorado o dia mundial do coração. A convidada é a psicóloga Gabriela Resende Lopes (CRP 04/64959), graduada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e especialista em saúde pela Residência Multiprofissional do Hospital das Clínicas da UFMG, onde atuou na área de Saúde Cardiovascular.
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– Luiza: Onde você está, Gabriela?
– Gabriela: Oi, Luiza! Estou em Formiga, uma cidade no interior de Minas Gerais, onde tenho atuado com atendimento clínico de forma presencial e online. É um prazer estar aqui com você! Agradeço muito pelo convite!
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– Luiza: Você pode contar mais sobre como foi o seu trabalho no hospital e como você identificava a ansiedade nos seus clientes?
– Gabriela: O trabalho em um hospital oferece um contexto muito particular, onde a ansiedade está quase sempre presente, tanto nos pacientes quanto em seus familiares. O ambiente hospitalar é frequentemente associado à dor, ao sofrimento e à falta de controle, o que acaba potencializando o surgimento da ansiedade. Existem diferentes tipos de ansiedade que podem ser identificados no cotidiano hospitalar. Elas são:
A ansiedade relacionada ao ambiente: desencadeada pelos equipamentos, procedimentos médicos, a rotatividade de pacientes, e até os sons característicos do hospital.
Relacionada ao corpo e à saúde: devido à restrição ao leito, às incertezas quanto ao futuro, à vida fora do hospital após o tratamento e à falta de controle da situação.
Relacionada ao tempo: ansiedade pela alta hospitalar; relacionada à continuidade da vida lá fora; ansiedade quanto ao tempo de espera no hospital.
Relacionado aos outros: pacientes que lidam com situações familiares complexas, ou mesmo com a necessidade de lidar com questões externas através do celular, como dar notícias ou resolver problemas à distância.
Esse ambiente intenso muitas vezes exacerba os sentimentos de ansiedade, manifestados através de sintomas como inquietação, irritabilidade, choro fácil e preocupações excessivas. No caso de pacientes com doenças cardíacas, esses sintomas podem gerar um ciclo de ansiedade ainda mais grave, dado que as alterações na pressão e nos batimentos cardíacos, comuns em situações de estresse, acabam sendo vistas como sinais preocupantes do quadro clínico.
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– Luiza: Quais são os principais desafios que você via no seu trabalho quando se tratava da ansiedade?
– Gabriela: O meu maior desafio no hospital sempre foi relacionado à concretude das situações que se apresentavam diante dos pacientes. Como falar sobre pensamentos catastróficos quando o paciente está numa situação extrema da sua vida? O coração é um grande símbolo de vitalidade para as pessoas, o centro, o motor do corpo. Então, se há um problema no coração, a pessoa entende que todo o resto está ameaçado. Acredito que o maior desafio foi dar um passo atrás em situações que eu considerava extremamente ansiogênicas e auxiliar o paciente a encontrar seu próprio caminho para enfrentá-las. Estava sempre me lembrando de que, por mais difícil que a situação parecesse, o paciente poderia superá-la com o devido suporte. Ou seja, talvez o maior desafio tenha sido lidar com o meu próprio medo e ansiedade!
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– Luiza: Você pode contar um pouco sobre um atendimento que te marcou?
– Gabriela: Decidi contar a história do atendimento que motivou a escrita do meu trabalho de conclusão da residência, uma pesquisa que fiz sobre a relação de pessoas em tratamento cardíaco com o trabalho. O atendimento a esse paciente foi solicitado por um membro da equipe, que percebeu que ele estava muito inquieto e ansioso. Ao chegar lá, ele logo me disse que estava ótimo e pronto para voltar para casa.
Ao convidá-lo a me contar um pouco de sua história, o paciente relatou de forma tranquila que, alguns dias antes, estava voltando do trabalho quando desmaiou e, para sua sorte, foi socorrido por um profissional de saúde que estava próximo ao local. Mais tarde, descobriu que estava na UTI e que havia estado em parada cardíaca por 30 minutos até ser reanimado.
Era a primeira vez que eu ouvia falar de alguém que havia ficado tanto tempo em parada cardíaca, então a história me chamou muita atenção. Ele me contou tudo com normalidade e ainda insistiu, com certa impaciência, que já não precisava mais estar ali.
Não pude deixar de compartilhar minha surpresa com ele e perguntei o motivo de tanta pressa, já que ele havia passado por uma situação tão extrema. O paciente então me explicou que o trabalho não esperava, e que ele já havia pausado suas atividades por mais tempo do que gostaria. A partir daí, começou a me contar sua relação com o trabalho e a importância que isso tinha para sua vida.
Meu atendimento, como muitas vezes acontece no cenário hospitalar, foi breve e pontual. Era principalmente sobre ser uma escuta compreensiva para o paciente e oferecer suporte para aquele momento que ele estava vivenciando. Logo depois, ele teve a alta hospitalar tão desejada, mas em minha mente ficaram várias reflexões.
No lugar de uma ansiedade voltada para o corpo e a sobrevivência, como eu esperava, o que se revelou foi um sentimento profundamente ligado ao aproveitamento de sua capacidade, do tempo e dos desejos que ele ainda queria realizar. Isso reflete, de maneira única, quem ele é como pessoa, quais são suas questões internas e os seus maiores anseios.
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– Luiza: Existem mitos comuns sobre a ansiedade e o coração que você gostaria de esclarecer?
– Gabriela: Não sei se existem mitos específicos, mas posso compartilhar algumas reflexões.
O coração é um órgão intimamente ligado aos sentimentos. Quando estamos ansiosos, muitos dos sintomas físicos que experimentamos estão relacionados ao coração, como o aumento dos batimentos e da pressão arterial. Essa é uma resposta natural do corpo ao mecanismo de “luta ou fuga”. Por outro lado, a ansiedade associada ao estresse agudo também pode impactar a saúde do coração – e isso não é um mito. Altos níveis de estresse por longos períodos podem desencadear tanto doenças crônicas quanto condições agudas, o que torna crucial buscar ajuda especializada quando percebemos que algo não está equilibrado.
Um dos mitos que frequentemente surgem entre pacientes com cardiopatias, que gera muita ansiedade, é a ideia de que eles não poderão retomar suas vidas normais após uma condição cardíaca grave. Retornar ao trabalho, praticar atividades físicas, manter uma vida social e sexual ativa, recuperar a independência não só é possível, como também é recomendado, desde que respeitando os limites e o tempo de recuperação de cada pessoa. Esse mito gerava muita ansiedade, tanto nos pacientes quanto em suas famílias, que muitas vezes os viam como frágeis e até incapazes.
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– Luiza: Quais são algumas das estratégias mais eficazes que você utilizava para ajudar as pessoas a reduzirem a ansiedade?
– Gabriela: No hospital, o primeiro passo era sempre convidar a pessoa a descrever detalhadamente suas experiências e sentimentos. Essa abordagem tem um efeito terapêutico, pois ao externalizar suas vivências, o paciente se conecta melhor com seu corpo e suas necessidades. No entanto, devido à dinamicidade do ambiente hospitalar, nem sempre era possível aprofundar nas questões pessoais ligadas à ansiedade, já que muitas vezes o paciente recebia alta rapidamente. Por isso, o foco era em intervenções pontuais e práticas.
Uma estratégia fundamental era ajudar o paciente a compreender o momento presente e a experiência que estava vivendo. Isso envolvia identificar seus sentimentos e reforçar que ele não estava sozinho no processo. Mesmo em meio à ansiedade, o paciente podia aprender a lidar com a situação atual de maneira mais consciente e menos desgastante emocionalmente.
Outra técnica eficaz era trabalhar a percepção da realidade. Ajudava o paciente a separar o que eram cenários gerados pela ansiedade do que estava realmente acontecendo. Esse exercício ampliava a visão das suas possibilidades, proporcionando maior clareza sobre o que estava acontecendo e o que podia ser feito.
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– Luiza: Você acredita que diferentes profissionais de saúde podem contribuir com a
redução da ansiedade?
– Gabriela: Com certeza! Ao longo da minha atuação, os outros profissionais da saúde foram peças chave para a redução da ansiedade do paciente e também para a manutenção de seu bem-estar. Todo profissional é capaz de contribuir para esse objetivo e é muito interessante trabalhar com uma equipe que seja sensível para esse tópico da saúde mental.
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– Luiza: Que profissional já contribuiu com você e os seus clientes?
– Gabriela: Posso dizer de muitos! Médicos, nutricionistas, enfermeiros, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais. Um exemplo marcante foi um trabalho em conjunto que desenvolvi com um fisioterapeuta. O paciente estava enfrentando dificuldades em avançar na prática física, devido ao aumento da pressão arterial, e o fisioterapeuta suspeitava que isso pudesse estar relacionado à ansiedade ao vez de uma limitação física. Trabalhando juntos, desenvolvemos uma estratégia integrada que incluía técnicas para controlar a ansiedade do paciente. Essa abordagem não só ajudou o paciente a melhorar seu desempenho físico, mas também foi crucial para que ele pudesse retornar para casa de maneira segura e com uma saúde física otimizada.
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– Luiza: Para encerrar, Gabriela, qual é a principal mensagem deste episódio que você gostaria que as pessoas se lembrem?
– Gabriela: A principal mensagem desse episódio é que a prática do psicólogo é muito particular e flexível! É preciso estar aberto às diversas demandas que surgem, mesmo quando todas estão relacionadas à ansiedade. Cada paciente é único e traz consigo uma combinação singular de experiências e necessidades. É a partir dessa singularidade que podemos compreender e ajudar de forma efetiva.
O coração é frequentemente visto como símbolo de nosso centro, sentimentos e alma. Assim, a ansiedade relacionada a ele se manifesta de maneiras variadas, conforme as prioridades e particularidades de cada indivíduo. Nosso trabalho é focar nas manifestações do paciente, ajudando-o a lidar com o que ele expressa e não apenas com o que inicialmente parece mais evidente, como uma condição cardíaca. Compreender e abordar a singularidade de cada paciente é essencial para oferecer um suporte realmente eficaz.
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– Luiza: Gabriela, muito obrigada por participar do episódio três do podcast “Ansiedade em foco”. Como as pessoas podem te encontrar na internet?
– Gabriela: Eu quem agradeço, Luiza! É um prazer poder contribuir e compartilhar informações. Para me encontrar online, o meio mais fácil é através do Instagram. Meu perfil é @psigabriela.resende, onde compartilho conteúdos sobre psicologia e bem-estar.
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Psi, espero que tenha gostado de conhecer a Gabriela e como a ansiedade pode influenciar a saúde do nosso coração. Compartilhe este episódio com uma amiga psi para ajudarmos mais pessoas a reduzir a ansiedade para viver com tranquilidade.
Nos reencontramos na quarta-feira que vem, às 13h de Brasília, para o episódio “Dentes” com a dentista Kristine Fortunato (CRO MG 63376).
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Luiza Aguiar Soares
Psicóloga | CRP 04/65266
Texto publicado em 18/09/2024